era 2019. eu escutava Stevie Wonder ao acordar no meu apartamento da Avenida São João. é uma memória com gosto, sabor e cheiro. memórias minhas comigo mesma, eu sentia uma liberdade porque já não mais trabalhava num lugar difícil, eu estava no último semestre da faculdade e finalmente ela acabaria… eu estava feliz, perdida mas, extremamente esperançosa com o que viria. a pandemia nem passava pela minha cabeça — E de mais ninguém. eu tinha 22 anos, era ingênua e acreditava que tudo era possível.
hoje, em 2024, eu escuto Stevie Wonder e me lembro de mim mesma. eu estou com 27 anos, tão doces como os 22 anos. mas, mais autoconsciente. entre tantas nuances sentimentais e relacionais, neste domingo à noite… eu penso e revivo as memórias das minhas relações afetivo-amorosas-sexuais.
meus ex-namorados me veem a mente e claro, a minha relação com o amor. revisito os textos que escrevi sobre eles na época em que eu os namorei. vejo a minha ingenuidade e disposição para o amor. eu tinha uma fé inabalável no sentimento amoroso e no outro. eu me jogava aos leões sem ter consciência de sua natureza.
lendo esses textos e com toda a bagagem dos términos, nuances, reviravoltas e psicanálise, eu me vejo, revejo e me acolho. eu era uma jovem muito bela na minha própria estupidez. e fazia poesia bonita disso.
amor é ação — diz bell hooks.
e, como é difícil agir de forma amorosa comigo.
Envergonho-me do que eu escrevi. eu tentava ser adulta para mim mesma, eu cheia de certezas e formalidades… eu tinha um medo profundo de encontrar o meu próprio estilo, eu tinha medo de mim mesma e dos meus sentimentos.
ainda tenho medo de tudo isso, mas as expressões são diferentes e eu consigo ser um pouco mais livre das prisões que eu crio para mim mesma. até consigo dizer não com mais frequência e não tentar agradar as pessoas a todo momento. isso melhorou as minhas relações com os outros e comigo mesma.
eu sou nerd.
mas, passei uma vida negando essa característica quando apontavam que ela era ruim. mas, me vangloriando quando apontavam que era uma boa característica.
que loucura é ser tão frágil a ponto de mudar de acordo com a validação dos outros.
eu enxerguei isso e tantas coisas mais nas minhas versões mais novas e no que eu escrevia. mas… a minha ingenuidade e a disposição eram muito bonitas.
as vezes, eu sinto falta disso. estar muito consciente impede boas histórias.
o desejo é uma pulsão extraordinária e minha luta constante hoje é desviar da “ânsia de possuir e do tédio de ter. eu quero me deleitar nos dois de uma forma balanceada.
domingo à noite e revisito amores, textos e memórias antigas. escuto belas músicas e sinto a profundidade de mim mesma… as vezes, é bom gostar de si — nas dores e nas delícias.
Jennifer Ernesto, 14.07.2024
			



