
“É importante lembrar que, apesar de a Constituição do Império de 1824 determinar que a educação era um direito de todos os cidadãos, a escola estava vetada para pessoas negras escravizadas.”
Eis a importância de uma intelectual negra, mais precisamente mestre em filosofia pela Unifesp, ser uma das pessoas públicas mais influentes da contemporaneidade — mesmo que haja tantas controvérsias e cobranças sobre a pessoa dessa mulher negra.
Se era vetado que os negros tivessem educação, como a perpcepção de si e sobre o mundo ocorreriam? Eis um dos mais incômodos processos de animalização e coisificação mais pesados e que reverberam até hoje em nossas estruturas sociais. Como se ousa falar sobre racismo como um recorte? É sobre toda uma concepção social e em todas as esferas.
Em primeiro lugar, há a desmistificação do que a sociedade brasileira é harmônica:
“É preciso identificar os mitos que fundam as peculiaridades do sistema de opressão operado aqui, e certamente o da democracia racial é o mais conhecido e nocivo deles. Concebido e propagado por sociólogos pertencentes à elite econômica na metade do século XX, esse mito afirma que no Brasil houve a transcedência dos conflitos raciais, pela harmonia entre negros e brancos, traduzida na miscigenação e na ausência de leis segregadoras.
No entanto, houve leis como a da vadiagem, a qual encarcerou negros que não tinham identificação empregatícia. E, além da segregação formal, fomos estigmatizados e colocados em determinados locais sociais.
“Como muitas pessoas negras que circulam em espaços de poder, já fui ‘confundida’ com copeira, faxineira ou, no caso de hotéis de luxo, prostituta. Obviamente não estou questionando a dignidade dessas profissões, mas o porquê de pessoas negras se verem reduzidas a determinados esteriótipos, eme vez de serem reconhecidas como seres humanos em toda a sua complexidade e com suas contradições.”
O livro é um convite a discussão sobre a luta antirracista, bem como dá ferramentas necessárias para que as pessoas possam entender minimamente a questão e também se incomodar. O livro não é palatável.
Ao descrever a afetividade e sexualidade da mulher negra, é evidente o histórico de violação, da negação do estupro histórico nos corpos negros femininos, uma vez que sofre o racismo e o machismo duplamente.
Ainda, afirma a importância da interseccionalidade na análise de todos os indivíduos e a necessidade de entender o que vem a ser hegemônico, excessão, individualismo e coletividade.
“A maioria dos negros vai aprender a ser negro no percurso de suas vidas.”
E quando essas vidas podem ser vividas, uma vez que o racismo é estrutural em suas instituições públicas e privadas, o que é claro pela violência policial contra os corpos negros e ainda, da própria baixa da polícia, a qual resguarda uma população de trabalhadores em situações de estresse extremo.
Por fim, reconhece-se que o livro é um chamado à luta mas, a luta é diversa, sendo que “há diferentes modos de percepção dos temas aqui tratados. Assim como ocorre com o movimento feminista, o movimento negro não é homogêneo e tem profundas discordâncias internas, portanto este manual está longe de querer esgotar qualquer assunto.”
Dividio nos seguintes títulos/temas… Informe-se sobre o racismo. Enxergue a negritude. Reconheça os privilégios da branquitude. Perceba o racismo internalizado em você. Apoie políticas educacionais afirmativas. Transforme seu ambiente de trabalho. Leia autores negros. Questione a cultura que você consome. Conheça seus desejos e afetos. Combata a violência racial. E. Sejamos todos antirracistas.
Mais do que necessário o exercício da leitura de pensadores negros, e claro, de forma bastante heterogênea.
(Jennifer Ernesto, 2019)




